sábado, 17 de outubro de 2009

O bobo da corte que leva o humor a sério

"No caso do CQC, procuramos explorar esse limite entre a ousadia e o desrespeito. (...) Às vezes, ultrapassamos, mas preferimos isso, a ficar com medo de ousar"

Notícia publicada na edição de 17/10/2009 do Jornal Cruzeiro do Sul, na página 1 do caderno D.
Assim Marcelo Tas, apresentador do CQC, que esteve esta semana em Sorocaba, se define

Ele já foi o Professor Tibúrcio, do infantil “Castelo Rá-Tim-Bum”, o repórter Ernesto Varela que, entre outras proezas, fez a Paulo Maluf, à queima-roupa, a pergunta que muita gente gostaria de ter feito (“É verdade que o senhor é corrupto?”), apresentou o “Vitrine”, da TV Cultura, e atualmente comanda o humorístico CQC, na Bandeirantes.
Perto de completar 50 anos, Marcelo Tas (sigla para o sobrenome Tristão Athayde de Souza), gravou, na quarta-feira, em Sorocaba os anúncios da nova campanha da Uniso. Nos filmes, que devem ser veiculados a partir do dia 19, fala do vestibular que será aplicado no final do ano pela instituição de ensino.
À tarde, no estúdio de tevê do curso de Jornalismo, conversou com a imprensa e estudantes. Tas falou, em resposta aos questionamentos, sobre educação, lembrou da importância de se dedicar aos estudos e disse que é a favor de uma formação específica para os profissionais da comunicação, sem valorizar demasiadamente o diploma cuja exigência foi derrubada pelo Supremo Tribunal Federal.
Comentou, ainda, do bom relacionamento com os admiradores que o seguem no twitter, ou postam mensagens no seu blog. O espaço, aliás, é bastante concorrido e tem o patrocínio de grandes empresas.
Sobre o CQC, atração que comanda ao lado dos comediantes Rafinha Bastos e Marco Luque, destacou o papel de conscientização. Lembrou que, esta semana, a atração abordou a campanha pelo voto contra os candidatos nas próximas eleições que tenham ficha suja.
Da matéria feita por Danilo Gentili, pinçou uma frase que considera ter sido a mais importante daquela edição. Num dado momento, ao entrevistar um senador, Gentili ouve do político: “essa é uma coisa que custa barato”. Em resposta, diz que, “em compensação, o senhor é algo que custa caro ao país”.
Já perto de ir embora, Tas conversou com o Mais Cruzeiro. Na entrevista, abordou temas como o esgotamento do formato do CQC, desmentiu boatos que davam conta da possível saída de Rafinha Bastos do programa, admitiu que prefere correr o risco de errar a não ousar, e disse estar muito preocupado com a volta da censura. Confira:

Censura, conscientização política, denúncia são temas recorrentes no CQC. Apesar do tom de irreverência, da proposta voltada ao humor, você diria que o programa é um caso sério?

Ainda bem que você falou nisso! Eu acho o CQC é um dos programas mais sérios da televisão brasileira hoje. Nós levamos o humor muito a sério. E o humor é para ser levado a sério. É nele que conseguimos falar a verdade. Historicamente até, o bobo da corte era o único que podia falar a verdade. E, por conta disso, às vezes, perdia a cabeça. Esse é o nosso papel: ser o bobo da corte, não se levar a sério, mas acreditando, ao mesmo tempo, que fazemos uma das coisas mais sérias da tevê brasileira.

A linha que separa o humor do escracho, do mau gosto, da falta de respeito, é muito tênue. Como evitar, num programa como o CQC, que isso aconteça?

Isso é muito difícil. Trata-se de uma avaliação subjetiva e, muitas vezes, ultrapassamos, sim, essa linha. No caso do CQC, procuramos explorar esse limite entre a ousadia e o desrespeito. No programa, pode-se chegar perto da ousadia, na hora de uma entrevista, de uma cena. Pode, por outro lado, escorregar no desrespeito. A gente procura chegar perto desse limite, sem ultrapassá-lo. Às vezes, ultrapassamos, mas preferimos isso, a ficar com medo de ousar. Chegou no limite, aconteceu a coisa que a gente gostaria que não acontecesse, a primeira providência que tomamos é reconhecer o erro, discutir e, eventualmente, pedir desculpas. Já fizemos isso, inclusive, publicamente. É importante reconhecer os erros. O primeiro ano do programa foi muito turbulento porque nos confundiram com outros formatos para a televisão. Entendo que, em razão dos cuidados, conseguimos criar um padrão diferenciado. Temos, hoje, um caminho próprio, independente de comparações. O CQC é CQC. Pronto! Acabou! Os erros do CQC devem ser creditados ao CQC, e não falar que o CQC se parece com outro programa. Essa é uma prática contínua. Corremos risco sempre. Invariavelmente toda semana temos problemas. Causamos problemas para nós mesmos, mas é assim que tem de ser.

A maioria dos formatos de programas humorísticos costuma esgotar-se rapidamente. Essa é uma questão que preocupa?

O esgotamento do formato não é algo que nos preocupe tanto assim porque o programa é um resumo semanal de notícias. A gente se abastece das notícias da semana, e elas vão continuar. Temos de tomar cuidado para conseguir dar a nossa versão dos fatos com qualidade. Esse é o “x” da questão. Existem várias maneiras de abordar a agenda da semana. E, evidentemente, escolhemos o que queremos abordar. É importante, primeiro, que a gente acredite no que faz; e que a gente consiga manter uma qualidade de humor, de comunicação, de clareza, de ética, ao longo do tempo. Que a gente não se canse de perseguir essa qualidade. Nós temos uma equipe de 40 pessoas que trabalham sete dias por semana. Todos são muito batalhadores, do boy ao motorista, até os repórteres, produtores, jornalistas, editores. Os caras que fazem o som do programa, pessoas desconhecidas do grande público. As matérias chegam a ser sonorizadas três vezes; os caras são muito bons, meticulosos. É assim que o programa dura, não se cansa e não cansa o telespectador.

Circularam rumores de que o Rafinha Bastos estaria disposto a sair do programa. O que aconteceu de fato?

Essa é uma daquelas histórias cem por cento infundadas. Percebemos que, quanto mais o programa ganha interesse, mais ficamos expostos, sujeitos a boatos, a mentiras, intrigas. Já saiu que a gente tinha brigado, que um não gosta do outro. Encaro isso como um treinamento, para testar nossa maturidade. Nada a ver, porém.

O episódio com o Danilo Gentili, que foi agredido por seguranças no Congresso, teria sido uma forma de censura velada?

Eu acho que vivemos, sim, um estado de censura velada, como você disse. Não só dentro do Congresso, onde funciona uma polícia formada por senhores de terno, que controlam, inclusive, os populares que querem acompanhar as sessões, o que é totalmente inconstitucional, já que qualquer cidadão brasileiro deveria ter acesso à Casa do Povo. Acho perigosíssimo em vários níveis. Temos jornais sofrendo censura, caso do “Estadão”, blogs sendo fechados, tentativa de censura à própria internet, como aconteceu nas últimas votações do Congresso (felizmente, a partir da pressão exercida, eles desistiram dessa sandice). Eu realmente fico muito preocupado, porque percebemos que a censura ainda está viva no Brasil. Esse é mais um motivo para ficarmos atentos, alertas.

Fonte: Cruzeiro do Sul

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